quinta-feira, 24 de novembro de 2022

António Gedeão | Lágrima de preta



Aqui fica mais um belíssimo poema de António Gedeão intitulado Lágrima de preta.

O poema foi publicado em 1961, no livro Máquina de Fogo, e musicado por José Niza, e cantado por Adriano Correia de Oliveira, em 1970. Apesar de a canção ter sido proibida pela censura na altura, o poema permanece um dos mais magníficos hinos à igualdade, sem sinais de negro, nem vestígios de ódio. E é mais atual do que nunca...



Letra:

Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.

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